
Uma Família Normal (Bo-Tong-Ui Ga-Jog AKA A Normal Family, 2023), longa-metragem dramático sul-coreano, distribuído pela Pandora Filmes, estreia, oficialmente, nos cinemas brasileiros, a partir do dia 01 de maio de 2025, com classificação indicativa 16 anos e 109 minutos de duração.
Como um velho lobo do mar cinematográfico, acostumado às profundezas da alma humana e aos abismos da narrativa, encaro “Uma Família Normal” com uma mistura de esperança e, infelizmente, crescente desilusão. O filme, adaptado do romance “The Dinner” de Herman Koch – uma obra já com um histórico de diversas transposições para a tela, já acende um sinal de alerta –, começa com uma promessa sedutora, um mistério que nos convida a desvendar suas camadas como um quebra-cabeça intrigante.
Um incidente de fúria ao volante com consequências brutais – a morte de um homem e o ferimento grave de uma criança – serve como catalisador para uma teia intrincada de personagens e dilemas morais.
Somos introduzidos a Jae-wan (Sul Kyung-gu), um advogado implacável cujo estilo de vida luxuoso esconde inseguranças, especialmente em relação à sua esposa mais jovem, Ji-su (Claudia Kim), e à tensão com sua filha mais velha, Hye-yoon (Hong Ye-ji).
Do outro lado, temos seu irmão, Jae-gyu (Jang Dong-gun), um médico que lida com a tragédia no hospital, enquanto sua vida familiar é assombrada pela doença da esposa Yeon-kyung (Kim Hee-ae) e o distanciamento do filho Si-ho (Kim Jung-chul).
A dinâmica entre essas famílias, já carregada de tensões, atinge um ponto de ruptura com um incidente envolvendo as crianças e um ataque brutal a um morador de rua, com um vídeo incriminador de agressores que se assemelham a Hye-yoon e Si-ho. O dilema é claro: proteger a família ou manter a moralidade.
A atmosfera inicial, com suas migalhas de pão sutis lançadas para que o público as siga, promete uma experiência intelectualmente estimulante. É um começo propulsor, que, apesar da dificuldade inicial em acompanhar a profusão de personagens, é envolvente. O diretor Hur Jin-ho demonstra flashes de brilho, como a tensão silenciosa em conversas sussurradas ou a beleza sombria das luzes da cidade.
No entanto, a energia que impulsiona o início da história se dissipa rapidamente. O mistério que nos atraiu logo se esvai, e o que resta é um melodrama exagerado. O roteiro de Park Eun-kyo e Park Joon-seok, ao tentar expandir o pano de fundo dos personagens através de melodrama, acaba por criar diálogos contundentes que sufocam qualquer nuance.
As dinâmicas entre os personagens – o advogado e o médico invertendo seus centros morais, as esposas conformadas, os filhos lutando com a identidade – são familiares e não evoluem de forma significativa, uma frustração para uma base que parecia interessada em explorar tópicos mais complexos.
Os fragmentos de informação que se revelam são apenas superficialmente provocativos, não aprofundando o suficiente para manter um interesse genuíno além da curiosidade básica. A cena inicial, por sua vez, não se torna uma âncora decisiva, e a narrativa se desvia para mais um ato de violência que apenas gera discussões insossas sobre dilemas éticos.
O elenco, um conjunto robusto, se esforça para dar vida aos seus papéis. Kim Hee-ae é o destaque mais impressionante, capturando um estado mental tumultuado e uma mistura convincente de força interior e vulnerabilidade, entregando a única performance verdadeiramente em camadas. Sul Kyung-gu também impressiona, embora demore para que seu exterior de aço revele um núcleo mais emocional. Jang Dong-gun e Claudia Kim são funcionais, mas seus personagens são amplamente desenhados, e o mesmo se aplica a Hong Ye-ji e Kim Jung-chul, cujos papéis carecem de profundidade, prejudicando suas representações.
Apesar da intimidade quase teatral na forma como os atores interagem, o resultado final não é extraordinário para um elenco competente que, como um todo, nunca atinge um patamar excepcional.
Em resumo, “Uma Família Normal” promete muito em seu início, com a intenção de nos puxar para uma teia complexa de conversas ousadas. Contudo, essa promessa nunca alcança seu potencial máximo, afogando-se rapidamente em revelações melodramáticas e diálogos diretos que não deixam espaço para descobertas mais instigantes. Apesar dos esforços dos atores e de alguns poucos momentos de destaque, a obra se arrasta em temas superficiais e retratos banais de personagens comuns. O que começou como uma análise envolvente, rapidamente se transforma em uma aventura cansativa, repleta de promessas desperdiçadas de uma análise mais profunda e cativante. É um jantar que prometia um banquete intelectual, mas que, ao final, se revela insosso e esquecível.