Encontro Com o Ditador (por Peter P. Douglas)

(Quando acreditar no sistema pode ser devastador)

            Encontro Com o Ditador (Rendez-Vous Avec Polpot, 2024), longa-metragem cambojano dramático, com classificação indicativa 14 anos e 112 minutos de duração, mergulha profundamente na complexa história política do Camboja sob o regime de Pol Pot. Dirigido por Rithy Panh, um cineasta que vivenciou os horrores daquele período como criança e adolescente, o filme é uma adaptação do livro “Les Larmes du Cambodge” de Elizabeth Becker, uma das poucas jornalistas que conseguiu entrevistar Pol Pot durante seu governo.

            O longa segue a jornada de três jornalistas franceses convidados pelo regime maoísta em 1978, com a promessa de uma entrevista exclusiva com o líder enigmático. Através de uma narrativa que avança sutilmente, Panh desenha um retrato assustador e esclarecedor do endoutrinamento e da corrupção dos ideais de justiça revolucionária.

            As atuações de Irène Jacob como Lise Delbo, Grégoire Colin como Alain Cariou e Cyril Gueï como Paul Thomas são bem verossímeis, mostrando como seus personagens são simultaneamente observadores e vítimas das circunstâncias.

            Na trama, tudo começa com a chegada do trio de protagonistas em um avião de luxo ao Camboja, mas rapidamente se torna evidente que sua visita será rigidamente controlada pelas autoridades locais. Inicialmente predispostos a aceitar a manipulação oficial devido a afinidades políticas, especialmente Cariou, que tinha amizades com líderes cambojanos desde seus dias de estudante na França, eles logo começam a perceber que a realidade é muito mais sombria do que a propaganda sugere.

            O diretor utiliza uma mistura de cenas dramáticas ao vivo com reconstruções feitas com maquetes de plastilina, muitas vezes combinando as duas técnicas simultaneamente e adicionando contraplanos e cenas documentais. Esta abordagem estilística não apenas destaca sua habilidade como cineasta, mas também serve para enfatizar a artificialidade da narrativa construída pelo regime de Pol Pot. O filme progride com os jornalistas se tornando cada vez mais cientes do genocídio em andamento, um fato que o regime atribui falsamente aos vizinhos vietnamitas.

            O conflito moral enfrentado pelos jornalistas é o que move o interesse do público: devem eles manter a integridade jornalística e questionar a versão oficial dos eventos, arriscando suas vidas e as de camponeses locais, ou devem permanecer em silêncio e tolerar o conto de fadas de uma sociedade idílica apresentada a eles? A tensão aumenta quando Paul, que é fotógrafo, desejando investigar por conta própria, desvia-se das rotas oficiais, provocando a ira das autoridades.

            Em suma, “Encontro Com o Ditador” levanta reflexões, pois desafia e provoca, forçando o público a confrontar a realidade de um genocídio e a responsabilidade da mídia, em uma época traumática da história do Camboja, sendo um lembrete sombrio de que a verdade muitas vezes é mais estranha e terrível do que a ficção.

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