
Detetive Chinatown: O Mistério de 1900 (Tang Ren Jie Tan an 1900, 2025), longa-metragem chinês de drama e mistério, distribuído pela Sato Company, estreia, oficialmente, nos cinemas brasileiros, a partir do dia 15 de maio de 2025, com classificação indicativa 16 anos e 135 minutos de duração.
Em 2025, o Ano Novo Lunar chinês celebra o Ano da Serpente, símbolo de mistério e renovação. Com isso em mente, a icônica franquia das bilheterias chinesas, “Detetive Chinatown”, retorna com seu quarto filme. Sob a direção de Chen Sicheng e Dai Mo, desta vez, a narrativa se desvia das habituais aventuras modernas (Bangkok, Nova York, Tóquio) dos detetives Qin Feng e Tang Ren, apresentando uma prequela que reconfigura o universo da série, ao se passar no passado.
Na Chinatown de São Francisco do século XX, os icônicos detetives Qin e Tang dão lugar a novos protagonistas: Qin Fu (Liu Haoran), um jovem fascinado por Sherlock Holmes, e Ghost/Ah Gui (Wang Baoqiang), um personagem enigmático cuja identidade mistura raízes chinesas e uma suposta ascendência nativa americana.
O principal conflito do filme ocorre entre americanos, irlandeses e chineses. A trama se desenrola entre múltiplas histórias interligadas, enquanto a dupla investiga uma série de assassinatos que abalam a comunidade. O mais impactante deles é o homicídio de Alice (Anastasia Shestakova), filha do congressista americano Grant (John Cusack). O suspeito é Bai Zhenbang (Zhang Xincheng), filho americano de Bai Xuanling (Chow Yun-fat), líder da Hip Sing Tong, uma organização de gângsteres benevolentes.
A suspeita de que o assassino seja chinês fornece a Grant uma justificativa para disseminar retórica xenófoba e impulsionar sua campanha pela remoção da população chinesa da cidade, através de um projeto de lei de exclusão.
Curiosamente, o filme dedica menos tempo de tela ao assassinato paralelo, ocorrido na mesma noite — o de um ancião nativo americano — reforçando um subtexto que sugere desigualdade na importância atribuída às vítimas dentro do contexto político e social da época.
Há também uma interessante história paralela sobre a Imperatriz Viúva Cixi enviando, da China para os Estados Unidos, oficiais manchus da dinastia Qing para capturar revolucionários, o que aumenta ainda mais a complexidade do filme.
Como se trata de uma comédia de mistério e assassinato, o enredo policial não é muito profundo, e as atuações dos personagens não chineses são um pouco inexpressivas (o que não é incomum para atores estrangeiros em produções asiáticas). Eu esperava mais de John Cusack e fiquei decepcionado porque sua atuação foi rígida e as falas pareceram forçadas. Ou talvez ele estivesse atuando de forma inexpressiva, já que sabia que era um filme de comédia? Não tenho certeza.
E haja esforço para se fazer um filme sobre o encontro do Oriente com o Ocidente, com caucasianos falando mandarim e personagens chineses falando inglês. Os diálogos eram alternados nos dois idiomas. Admito que fiquei um pouco perplexo com o assassino se chamar “Jack, o Estripador”, até entender como o roteiro faria para encaixar esse serial killer inglês na américa.
Fiel ao tom vibrante e otimista característico da franquia, o filme aposta fortemente na comédia pastelão, combinada a uma produção visual impecável. Os oficiais manchus foram hilários representando a ascensão e queda da China como país. E um dos momentos mais memoráveis ocorre no primeiro encontro dos protagonistas: enquanto Ghost/Ah Gui aguarda introspectivamente um “sinal”, Qin Fu despenca sobre ele após cair de uma janela, em uma cena hilária que abraça o humor físico. O filme brinca com a estética do encontro fofo, realçando o instante com música romântica e uma edição em câmera lenta exagerada.
As lutas intencionalmente desajeitadas, marcadas por cortes rápidos e piadas astutas baseadas em pronúncia, garantem momentos de leveza e diversão. No entanto, ao longo de suas quase 2 horas e 20 minutos de duração, o excesso desses artifícios — aliado a uma trama entrelaçada de forma caótica — pode tornar a experiência cansativa.
Importante ressaltar que, apesar do tom leve que domina boa parte da narrativa, o filme adota uma abordagem mais séria em sua metade, explorando as dificuldades enfrentadas pelos chineses em São Francisco no passado — embora se saiba que a realidade histórica foi ainda mais sombria do que a retratada na tela.
Chow Yun-fat fez um trabalho fantástico ao entregar os melhores diálogos da obra, transitando entre momentos de humor e discursos emocionantes sobre a opressão dos chineses na América. Os dois atores principais, Liu Haoran e Wang Baoqiang, também estiveram imersos em seus personagens, entregando suas falas de forma ideal para causar risos ou criar tensão.
A mencionada queda da Imperatriz Viúva Cixi ocorreu anos depois dos eventos do filme, mas, para reforçar a mensagem sobre as transformações na China impulsionadas pela revolução, a linha do tempo foi ajustada para se adequar à narrativa. Importante ressaltar que, ao longo de sua extensa duração, o filme constrói um apelo direto, incentivando cidadãos chineses insatisfeitos a retornarem à sua terra natal, buscando refúgio no acolhimento da pátria.
Em resumo, “Detetive Chinatown: O Mistério de 1900” acerta em sua ostentação visual e humor físico, mas sua tentativa de construir uma revelação bombástica no estilo “eureca!” acaba sendo previsível demais, reduzindo as oportunidades para reviravoltas genuinamente surpreendentes. Ainda assim, sua conclusão adicional reserva um momento que certamente pode causar espanto.