
As Aventuras de uma Francesa na Coréia (A Traveler’s Needs, 2024), longa-metragem sul-coreano de comédia dramática, distribuído pela Pandora Filmes, estreia, oficialmente, nos cinemas brasileiros, a partir do dia 10 de abril de 2025, com classificação indicativa 14 anos e 90 minutos de duração.
Imagine um universo onde cada diálogo pode ser a ponta de um iceberg emocional e cada personagem guarda segredos que só emergem quando observados sob uma nova perspectiva. Essa é a essência do filme dirigido por Hong Sang-soo, uma obra que lembra a familiaridade de uma narrativa comum apenas para subverter, desconstruir e envolver o público em sua peculiaridade.
Na trama, Iris (Isabelle Huppert) uma mulher francesa, vaga por Seoul, na Coreia do Sul. Uma estrangeira, ensinando francês de uma forma experimental que é tão pessoal quanto curiosamente duvidosa. Usando as experiências emocionais de seus alunos como matéria-prima, Iris cria guias de estudo únicos que, em sua essência, abrem as portas para confissões profundas. Ela é tanto terapeuta quanto catalisadora de revelações inesperadas. Contudo, em sua jornada, Iris parece limitada por sua própria superficialidade, deixando lacunas narrativas para o público preencher, pois incapaz de transmitir verdadeiramente a essência que Hong geralmente imprime em seus protagonistas.
O longa é organizado em três atos distintos, cada um mais peculiar que o anterior. Inicialmente, a interação entre Iris e Isong (Kim Seung-yun) traz um mergulho na fragilidade emocional. Como Hong muitas vezes faz, a simplicidade de uma conversa transforma-se em um estudo psicológico ao longo de tomadas longas e cruas. A câmera observa sem piedade, quase como se tivesse sua própria intenção. Mais adiante, porém, a presença fragmentada de Iris é eclipsada pelos coadjuvantes, personagens vividamente interpretados por rostos já familiares no universo de Hong. Eles roubam a cena e, por um momento, deixam o público ancorado nesses mundos paralelos, enquanto Iris flutua.
No ato final, o filme mergulha em uma atmosfera de tensão. A relação entre Iris e Inguk (Ha Seong-guk), que a hospeda sem cobrar aluguel, sugere intenções ambíguas. O que começa como uma dinâmica pouco usual entre uma hóspede e um jovem prestes a desmoronar financeiramente, rapidamente se transforma em algo mais obscuro quando a mãe de Inguk, Ranhee (Ha Jin-wha), entra na história. A intensidade cresce, e a narrativa vagueia por territórios familiares ao diretor, onde as feridas da alma se manifestam em diálogos entrecortados e momentos de desconforto quase ritualístico.
O charme do filme reside no que não é dito, no que está oculto por trás de olhares prolongados e ações aparentemente banais. Hong Sang-soo brinca com nossas expectativas, como se quisesse que olhássemos para os detalhes que não estão realmente lá. Embora o filme oscile entre momentos de profundidade emocional e partes menos envolventes, o trabalho de Hong Sang-soo permanece fiel a sua essência de observar o humano em suas contradições.
Em resumo, “As Aventuras de Uma Francesa na Coréia”, pode não ser uma das obras mais lapidadas de Hong, mas, como todo ato criativo sincero, oferece frutos para aqueles que se dispõem a colher. O longa não se propõe a explicar, apenas convidando o público a observar, sentir e, talvez, desvendar algo em si mesmo, pois muitas vezes o verdadeiro impacto está no que fica no ar, nas interpretações divergentes e nas perguntas que permanecem sem resposta.