É diferente observar como Helena Ignez, uma figura central no cinema brasileiro, tanto como diretora quanto atriz, optou por um estilo de produção mais intimista. Enquanto muitos cineastas almejam projetos grandiosos e repletos de riscos, Ignez escolhe um caminho alternativo, focando em obras de orçamento reduzido e cercando-se de familiares e amigos íntimos.
Seus filmes refletem suas inquietações políticas e sociais, abordando temas como a situação feminina, a intolerância às diferenças e a questão palestina. Tais preocupações são tecidas em narrativas fluidas e fragmentadas, com cenas que funcionam quase como vinhetas independentes.
A trama começa com um casal de idosos, interpretados por Helena Ignez e Ney Matogrosso, conversando na praia, até que flashbacks revelam um passado doloroso. No entanto, esses flashbacks são breves e não definem a história. A narrativa é pontuada por elementos que surgem e desaparecem, personagens que são introduzidos e logo abandonados.
Se um projeto assim fosse proposto por uma diretora novata, provavelmente não passaria pelo crivo de produtores, que poderiam criticar a falta de estrutura e direcionamento claros. O cinema de Ignez é simbólico e alegórico, desafiando expectativas ao rejeitar qualquer pretensão de naturalismo. Há uma sensação lúdica, como na cena em que Negro Léo interpreta um padre a favor da maconha, ou Mário Bortolotto se retrata em uma academia de boxe. As cenas frequentemente mostram amigos em momentos de descontração e diálogo. Quando Ignez assume o papel de uma sexóloga, ela não apenas educa suas alunas sobre o orgasmo feminino, mas também se posiciona como uma líder e ícone, simbolizada pelo nome de sua personagem, Jarda Ícone.
No entanto, o filme é construído sobre diversas cenas menos expressivas. As conversas da personagem Jarda Ícone à mesa resultam acessórias, quando temas importantes são despejados de maneira didática, sem contexto nem aprofundamento. Trata-se de sonhos misturados com fatos, ainda que aparentem meras preocupações verbalizadas, ao invés de representadas e trabalhadas em imagens.
A Alegria é a Prova dos Nove não possui uma esteira estética que o ligue. Sua roupagem não segue qualquer padrão, ou mesmo a falta de padrão comunica sua ideia narrativa; qualquer ideia de unidade é esquecida, e o filme acaba passando como algo pouco caprichado.
Publicado originalmente em https://www.pegaessanovidade.com.br/pega-essa-dica-alegria-e-a-prova-dos-nove/
Compartilhe