Eu, Capitão (Io, Capitano, 2023), longa-metragem dramático, coprodução Bélgica, França e Itália, distribuído pela Pandora Filmes, com classificação indicativa 16 anos e 122 minutos de duração.
Dirigido por Matteo Garrone, navega habilmente entre a crua realidade dos migrantes africanos e o uso sutil do realismo fantástico para aliviar a gravidade da narrativa. O filme segue a jornada de dois primos senegaleses, Seydou e Moussa, que se lançam em uma perigosa travessia pelo deserto e pelo mar com a esperança de uma vida melhor na Europa.
A performance dos atores é convincente, transmitindo com eficácia a angústia e a determinação dos personagens. O diretor não poupa o público de cenas impactantes que retratam a violência e a exploração enfrentadas pelos protagonistas, porém o faz de uma forma que evita cair no sensacionalismo, optando por uma abordagem que prioriza a emoção sobre a explicitação do sofrimento.
A narrativa é marcada por contrastes fortes, como a alegria e a música de Dacar, que se opõem à aspereza do deserto e à secura emocional da jornada. Essa dicotomia é bem explorada e contribui para a profundidade da história. O uso do realismo fantástico é outro ponto alto do filme, oferecendo momentos de respiro e poesia em meio a um contexto desolador. Por exemplo, a cena em que Seydou deseja comunicar-se com sua mãe ou seu desespero ao testemunhar o sofrimento de uma senhora durante a travessia do Saara são momentos em que o fantástico se infiltra na narrativa para enfatizar a humanidade dos personagens.
Contudo, em alguns momentos, a transição entre o realismo e o fantástico pode parecer abrupta, deixando o público confuso quanto ao tom da história. Além disso, a representação dos desafios enfrentados pelos migrantes, embora poderosa, às vezes pode parecer um tanto unidimensional, não explorando completamente a complexidade das experiências dos personagens. A cinematografia, embora bela, não é sempre consistente, com algumas cenas parecendo desconexas da estética geral do filme.
Em termos de enredo, é uma jornada de amadurecimento para Seydou, que é forçado a confrontar a realidade brutal do mundo fora de sua terra natal. O clímax do filme, onde Seydou assume o comando do barco rumo à Itália, é simbólico e poderoso, encapsulando o crescimento do personagem e sua transição de menino a homem.
Em suma, “Eu, Capitão” é um filme que, apesar de suas imperfeições, oferece uma visão penetrante sobre a crise dos migrantes e a busca por dignidade. Garrone entrega uma narrativa que é tanto uma homenagem à coragem dos que fazem essa perigosa viagem quanto uma crítica àqueles que permitem que tais viagens sejam necessárias.
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